segunda-feira, 9 de março de 2020

CICLO DE FILMES GRANDES DIRETORAS "AGNÈS VARDA": Cléo Das 5 as 7 (1962)

CLÉO DAS 5 ÀS 7
Joaquim Ferreira 

Após a realização de "La Pointe-Courte" em 1955, Agnès Varda destacou-se como referencia para o desenvolvimento da Nouvelle Vague, mesmo sem certo reconhecimento "oficial".
Se em "La Pointe-Courte" Varda mostrou sua competência técnica pela experiência com a fotografia e utilização de uma linguagem teatral no cinema, em " Cléo das 5 as 7" , percebemos uma história ,uma dramaturgia mais estruturada junto ao seu estilo documental de fazer cinema que foi uma das marcas da "Nouvelle Vague" e que Agnès Varda representou muito bem .
Na história de " Cléo das 5 as 7" , a atriz Corinne Marchand(1937) representa o papel de uma cantora pop que passa as duas horas delimitadas pelo título do filme aguardando os resultados de exames médicos que podem apontar se contraiu ou não uma doença. O período de espera da protagonista da primeira consulta até o resultado final do exame, mostra Cléo imersa em suas dúvidas pelo que pode ocorrer ou não com sua saúde. Nesse período , ela repassa toda sua vida num flashback mental.
Agnès Varda utiliza-se de truques para pequenos saltos no tempo. A montagem do filme foi feita para nos dar a sensação de seguirmos também personagens e situações que cruzam seu caminho e dialogam com Cléo. como se os espelhos "refletissem não apenas a beleza e as dúvidas da protagonista, e sim um amálgama de todas as mulheres na sociedade contemporânea."
E ao andar pelas ruas de Paris , Cléo perde seus medos das ruas e vislumbra, além da própria vida , uma situação cotidiana que não percebia pois estava presa nas suas duvidas,anseios e superstições. Assim, ela passa a olhar a cidade com outros olhos, tal qual o filme mudo que assiste com uma amiga, cena de destaque pela presença do casal " Nouvelle Vague" Jean-Luc Godard e Anna Karina, um curta tragicômico em que ele só vê o lado bom da vida após tirar seus óculos.
Deste modo, ações aparentemente banais, ganham significados mais profundos.. A própria Cléo dialogando com sua secretária supersticiosa marca , para mim, o rompimento e a superação de uma postura fatalista e supersticiosa no trato com seus problemas .O filme inclusive inicia -se com Cléo consultando uma cartomante que da a entender que a morte está próxima . Agnès Varda filma alternadamente as cartas usadas pela cartomante em cores e em o preto e branco, sugerindo que a fantasia e a realidade dialogam,mas é a realidade que interessa ao cinema de Varda.
Com a câmera focada em sua estrela principal, mas sem nunca deixar os detalhes das parisienses ou dos coadjuvantes fora de rumo, Agnès Varda "apresenta uma narrativa feminina e feminista na mesma medida obra intimista, nunca menos expressiva sobre o feminino e a própria sociedade. Uma relação que vai muito além do feminismo em alta da época, em que fica claro pelo olhar que não é um homem contando esta história. É por uma mulher que entende o gênero sexual como ninguém e quer repassar esta visão para o mundo. "
O filme é de 1962 porém não é datado . Cléo representa é várias mulheres em uma só e os temas existenciais, as diferentes visões sobre vida e morte e como as mulheres se encaixam nisto tudo são extremamente atuais .

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