sexta-feira, 26 de julho de 2019

Manifesto a Favor do Cinema


Ciclo de Filmes "Grandes Diretores"

A  partir de agosto, além da  programação regular dos sábados ,  o Lumière  realizará  também sessões todas as terças-feiras dedicadas aos grandes cineastas. Denominado de  Ciclos de Filmes   "Grandes Diretores",  essa série de exibições tem como objetivo  aprofundar o gosto pelo cinema  através de  sua  história , o processo de criação de cada diretor ,sua biografia , seus aspectos técnicos, estéticos,  dentre outros .  Deste modo, as exibições  serão  precedidas por uma breve exposição de cada curador sobre  a  obra do cineasta escolhido. O  grande desafio  é sintetizar  a partir de filmografias geralmente extensas   o sentido geral da obra nos filmes escolhidos. O  ciclo  também que reforçar  ainda mais os laços de camaradagem e convivência democrática que nos uniram  ao  longo de três anos de exibições .
Ciclos de Filmes  "Grandes Diretores" , terças- feiras, 18 horas, na Euterpe Lumiarense. Boa sessão à todos!

segunda-feira, 8 de julho de 2019

Dois Dias,Uma Noite(2014, Jean-Pierre e Luc Dardenne;2014))




Indicação.,apresentação do filme e textos:: Reinado Silva


Sobre os diretores Luc e Jean-Pierre Dardenne
Neste esboço apresento a filmografia atualizada, segundo a Wikipédia, sobre a produção dos diretores. No próximo comentário apresento o filme Dois Dias (*), Uma noite. Para quem estiver interessado, existem vários vídeos sobre os Diretores no Youtube.
*A atriz Marion, que faz a personagem central do filme (Sandra) foi indicada ao Oscar de melhor atriz.
Nacionalidade: Belga - Nascimentos: Luc – 10/03/1954; Jean-Pierre – 21/04/1951
Como Diretores/Produtos/Roteiristas:
34 filmes; 15 documentários e 07 curtas metragens
Prêmios: Ganhadores da Palma de Ouro do Festival de Cannes pelos filmes Rosetta (1999 – apresentado no cine Lumière) e A criança (2005;
Ganhadores do Grand Prix (é o segundo prêmio mais respeitado do Festival de Cannes, no qual o juri escolhe o melhor filme, perdendo somente para Palma de Ouro) pelo filme O Garoto da Bicicleta (2011 – apresentado no cine Lumière);
Melhor Roteiro: filme O silência de Lorna (2008)
Melhor Direção: filme O jovem Ahmed (2019) – o mais recente filme

Dois Dias, Uma noite
No dialógo abaixo, entre a personagens do filme, Sandra, e o diretor da empresa, Dumont, encontramos as questões centrais que diz respeito ao “realismo social”. Não é por acaso que este diálogo ocorre, aproximadamente, dois minutos antes do término do filme. Ele resume o percurso tenso marcados por decisões, avanços e recuos, dúvidas e incentivos, medos, egoísmos e impossibilidades, decorrentes de interesses próprios dos relacionamentos humanos. Vamos ao diálogo:
Dumont: - Você convenceu metade do pessoal a renunciar o bônus. Parabéns! Entretanto, a metade não é a maioria. Porém, para que não haja rancores na equipe ... decidi conceder o bônus e reintegrá-la. Não posso contratá-la de imediato porque quando você estava de licença, Jean-Marc e eu percebemos que 16 eram suficiente para o trabalho, invés de 17. Ao final de setembro não renovarei um contrato de prazo fixo ... e então você poderá voltar. Até então ficará dois meses tecnicamente desempregada. Essa é a boa notícia que queria lhe contar. Você ficará conosco.
Sandra:- Não posso ocupar o lugar de alguém que será demitido.
Dumont: - Não será demitido, seu contrato não será renovado.
Sandra: - É o mesmo.
Dumont: - Não
Sandra: - Adeus, senhor Dumont
.
Ao sair da empresa Sandra conversa no celular com o seu marido, a quem chama de Manu.
Sandra: - Sim, será difícil. Mas começarei a procurar hoje. Sim. Sim, ao meio dia? Sim, eu também. Até mais.
E, antes de desligar o celular conclui Sandra sorrindo com um semblante vitorioso:
- Foi uma batalha bem lutada. Estou feliz.

Os temas sociais de caráter moral e ético retratados pelos diretores em todos os seus filmes são atuais em qualquer lugar do mundo e incomodam porque nos aproxima das estórias de vidas dos personagens. Por isso, assistir esse filme é também uma reflexão sobre questões que dizem respeito ao que “vivenciamos” em nosso dia a dia.
O “realismo social” dos irmãos Dardenne são marcados não apenas por temas provocativos, eles estão intimamente relacionados a forma como são apresentados. Os diretores tentam em cada cena transformar os expectadores em coadjuvantes, na medida em que ruídos, respiração dos atores, diálogos, ambientação, tomadas das cenas e movimentos da câmara capturam nossa atenção, aproximando-nos da narrativa e envolvendo-nos na emoção decorrente dos temas apresentados.
O filme Duas Noite, Um dia é imperdível !!!!!!!!!
Reinaldo


quinta-feira, 4 de julho de 2019

Oito e Meio (1963,Federico Fellini)


Indicação e apresentação do filme: Renata Camargo

Texto:Reinaldo Silva
                  
 8 ½ Fellini, o diretor sem sucessor

O título aparentemente enigmático do filme nada mais é do que uma fase felliniana de Fellini. Enigma que ele conseguiu transferir para tela não só os sintomas do que vivia. Quero dizer com isso que Fellini reune vida e obra artística, sinalizando diversos fragmentos presentes em  seu percurso como maestro/regente - nome italiano que coloca a figura simbólica exercida pelo diretor de filmes num patamar mais elevado.
O Filme 8 ½ e o sonho no início do filme
A primeira cena do filme é um vulto de homem se debatendo dentro de um carro parado no engarrafamento do trânsito, e sendo observado por inúmeros passageiros dos outros carros que não esboçam nenhuma atitude solidária para ajudá-lo; ao contrário, seus olhares demonstram recriminação. Quem são esses personagens inquisidores?
Para nós que vemos o filme é um alívio vermos o vulto sair do carro após um enorme esforço e voar como um passáro que escapa do terror de uma gaiola. Mais adiante vamos descobrir que esse vulto é Marcello Mastroianni, utilizado por  Fellini com seu “alter-ego”. Os sonhos estão em todos os filmes de Fellini. 
Fellini utiliza com extrema habilidade a metalinguagem, grosso modo, significa o uso de recursos visuais que não pertencem ao meio no qual está sendo. O conceito ou a noção de metalinguagem é um dos recursos, utilizados por Diretores de filmes, quando desejam fornecer conteúdo mais elaborados dos filmes. 
8 ½ Sintomas Fragmentados de futuros filmes
O que tento traduzir pela noção de sintomas está em todas as cenas, o que requer a paciência de quem assisti, porque aqueles olhares que observavam Mastroianni se debater até escapar do carro, vão se corporificar em produtor, agente de atores, atores lutando pela participação no filme, a imprensa especializada, os críticos, os técnicos que fazem parte do set de filmagem. Resumo, todos cobram um projeto de filme, indagam ostensivamente sobre como será o filme, se o filme será uma estória inédita de amor que ele até então não havia realizado (e jamais realizará) à maneira de Hollywood. A impaciência do Produtor em saber quando poderá calcular o valor do retorno de seu investimento é visível e irritante até o final do filme. Até o padre é convocado na tentativa de dissolver o mal que habita o diretor. Mas, tudo infrutífero, ele não tem um projeto de filme, ou melhor, possue fragmentos e chega a dizer que gostaria de “colocar tudo no filme”. Sua relação afetiva com a esposa vai de mal a pior, suas ambiguidades se expressam em uma ausência de potência para levar adiante um projeto de filme. Pressões e mais pressões, e num exagero tipicamente felliniano, a única saida é o suicídio. Fica então estabelecido que o Diretor está vivendo “uma crise de criação na sua manifestação artistica”.
E justamente quando tudo parecia naufragar, Fellini de maneira encantadora faz do filme uma catárse. Será que Fellini estava realmente vivendo “uma crise” ou tudo não passou de uma simulação para ter um projeto de filme? Já rolou muita tinta, análises, artigos e teses para responder essa pergunta.
Catarse
O que é uma catarse? De forma simples e compreensiva (embora não seja só isso) a catarse é a manifestação pública do que estava incomodando, das pressões dos afetos subjetivos impossíveis de ser controlados, do grito que não dá mais para  ser sufocado. Fazer da catarse uma arte requer talento, habilidade rara, capacidade acima da compreensão comum. Tudo bem felliniano.
Como disse acima esse é o encanto de 8 ½, número incompleto, isto é, um filme que fica no meio. O que é importante também assinalar é que alguns elementos dessa possível catarse estão em todos os filmes de Fellini. Encontramos os personagens do circo, uma mulher de aparência exótica, a igreja católica, os adolescentes sempre inquietos, sonhos recorrentes à infância, a presença de “tipos-ideais” da família italiana, a presença marcante de mulheres exageradamente maquiadas trajando roupas extravagante, homens dispostos a consagrar a virilidades em salões e prostíbulos, a classe social dos aristocratas com sutis ares de fascismo, gestos teatrais num clima delirante que beira a loucura ... personagens que habitavam os filmes ou a mente de Fellini.   
Finalmente, quero fazer menção ao que a Renata falou quando apresentou o filme. Ela observou que o filme possui uma forte relação com as artes plásticas. Concordo, principalmente com a excelente cópia restaurada do filme. Fica bastante visível a apropriação que Fellini fez da arte plástica quando congelamos, como se fosse um quadro fixo determinadas cenas nos detendo  em detalhes e sombras da composição. Mas, para que pudéssemos avaliar se um estilo de pintura renascentista ou outros estilos estão presentes no filme, teríamos que congelar as cenas e analisar comparando pintura e filme. Talvez isso possibilite uma outra leitura do filme 8 ½. 
A diferença entre arte plástica e arte cinematográfica é de cunho processual. Todo processo de criação de um quadro é de autoria individual. Já o filme é um processo industrial, coletivo, dependente de variáveis individuais. Para que um filme seja considerado clássico, toda equipe técnica tem que estar totalmente afinada com a idéia central do Diretor. Grandes diretores, como Fellini, possuem a sensibilidade que extrapola o campo das suas funções e consegue, (como a Renata observou), transpor e unir para tela do cinema expressões artísticas que pertencem aos outros processos artísticos. A música, por exemplo, foi e é tão utilizada nos filmes, que passaram a ser uma exigência naturalizada. Um filme não se limita a seu campo específico, no qual somente deva ser considerado o que lhe é próprio. O filme é uma herança da fotografia. A característica fundamental são os processos diferenciados entre filme, arte plástica, fotografia, música, poesia, teatro ...

Como todo filme clássico 8 ½ merece ser visto e revisto. O importante quando revejo um filme e converso com outras pessoas a seu respeito, descubro, ou pelo menos imagino que descubro, uma nova forma de olhar e pesquisar sobre as minhas dúvidas. Por exemplo, a leitura de um clássico, seja um filme, um livro, um quadro, uma escultura não se esgota. Não existe uma interpretação definitiva, aliás com tudo na vida. Toda interpretação é temporal, ligada ao tempo. É dele que extraimo a vontade de saber, uma curiosidade, a única maneira de continuar vivo.
Reinaldo  Silva