segunda-feira, 11 de julho de 2016

Baile Perfumado( Lírio Ferreira, Paulo Caldas;1997)


Indicação do filme,apresentação e texto: Joaquim Ferreira


BAILE PERFUMADO:  O CANGAÇO REVISITADO

Benjamin Abrahão Botto : o homem que fotografou  Lampião.

 O filme mostra a  trajetória de Benjamin Abrahão Botto(1890-1938)  , um mascate libanês que viveu com intensidade a agitação política da década de  1930 no Nordeste brasileiro. Após ter sido  secretário particular do Padre Cícero, Benjamin  articula uma rede de contatos que lhe permitiu filmar as únicas imagens de Lampião e seu bando. O filme, que registra a vida no cangaço , foi proibido pelo ditadura  de Getúlio Vargas.
Um dos primeiros filmes da época da Retomada do cinema brasileiro,  Baile Perfumado  mostra um Lampião menos bandido,  menos herói, e  que se apropria, durante as filmagens de Benjamim,    de elementos  cênicos  e tecnológicos que constroem uma  visão mais  humanizada do cangaceiro, mas não menos contraditória  . Através de sobrevôos de câmera  ,   mostram  paisagens nordestinas verdejantes, com rios caudalosos,  uma trilha sonora que mistura guitarras  elétricas com  sanfona,   contraponto as imagens  clássicas dos filmes  sobre o cangaço.
 " O que assistimos é Lampião fazendo cinema, assumindo o filme que até então era personagem. Fascinado pela possibilidade de construção da própria representação, permite que juntamente com seus cangaceiros seja imortalizado através da câmara de Benjamin Abrahão, que livremente mostra Lampião, Maria Bonita e seus seguidores na plenitude do culto à aparência, exibindo anéis, armas, chapéus, medalhas, perfumes e bebidas. Filmou-os no flagrante da vida cotidiana, focalizando os mínimos detalhes do grupo: rezando, dançando, conversando, brincando com a câmera. A dimensão da preciosidade rara das imagens dessa parte da história do Nordeste brasileiro é dada pelo próprio material produzido tanto como pelo risco da empreitada, que resultou no cerco da polícia a Lampião, proibição e apreensão do filme e na morte de Benjamin Abrahão, eventos apresentados em ações paralelas estruturadas em vários núcleos narrativos que vão conduzindo o filme para esse desfecho." Baile Perfumado: o contemporâneo no cinema nordestino Marise Berta.IN:  Kino Digital – Revista Eletrônica de Cinema e Audiovisual, nº 1, dez. 2006
  Mesmo visando a comercialização e o lucro com seu trabalho (foi assim com o Padre Cícero)  ,  Benjamin,o   documentarista estrangeiro,   tem  praticamente passe livre  no transito  entre as forças sociais  existentes. A figura do estrangeiro na pesquisa histórica e social, é  a metáfora do próprio  pesquisador  que pretende ser neutro e observa por cima de interesses   e forças diferentes. Benjamim costura um enredo que mostra um quadro mais complexo do cangaço e do próprio Nordeste.E o próprio diretor de cinema , muitas vezes é o próprio estrangeiro..Assim, os   diretores  Lírio Ferreira e Paulo Caldas procuraram  superar certo  maniqueísmo historiográfico  do banditismo x ordem, do mau x bom, tendo em vista a ausência de projetos revolucionários  do cangaço para mudar a ordem social e a rede de relações entre o poder do Estado, os "coronéis"  e os cangaceiros. A figura do " Robin Hood tropical"encarnada em Lampião não se sustenta com a trama do filme ao mostrar  também a mercantilização do cangaço, que venha ser a espetacularização da realidade pelas lentes documentaristas.


2 comentários:

  1. O próprio Lampião , assegurou em um bilhete * que todas as imagens eram produto do trabalho de Benjamin Abrahão:

    Illmo Sr. Bejamim Abrahão

    Saudações
    Venho lhi afirmar que foi a primeira peçoa que conceguiu filmar eu com todos os meus peçoal cangaceiros, filmando assim todos us muvimento da noça vida nas catingas dus sertões nordestinos.
    Outra peçoa não conciguiu nem conciguirá nem mesmo eu consintirei mais.
    Sem mais do amigo
    Capm Virgulino Ferreira da Silva
    Vulgo Capm Lampião

    (*Mantida a grafia original)

    Fonte : Benjamin Abrahão: Entre Anjos e Cangaceiros
    Autor: Frederico Mello

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  2. Entendo que o documentário é a forma cinematográfica com a qual me identifico, quando se retrata personagens que tiveram atuação histórica reconhecida na cultura das sociedades. Os motivos dessa minha escolha são os seguintes:
    * pesquisas de documentos conhecidos ou inéditos;
    * depoimentos que podem revelar fatos antigos ou inéditos não publicados;
    * teses e material publicado a respeito do personagem e que possa ser comparado;
    * todo material impresso ou visual que puder ser consultado.
    Mesmo levando-se em conta a perícia na pesquisa de todos os elementos consultados, sempre existirá em todo documentário a distância inexorável entre o que é retratado sobre o personagem e suas motivações pessoais e políticas.
    Por isso empreguei a palavra glamour (atraente, cativante, sedutor, tentador) sobre as imagens do filme Baile Perfumado. Porque, não importa a motivação de sua ideologia. Todos os Lampiões que utilizam meios políticos violentos para justificar quaisquer princípios não me cativam, muito pelo contrário.
    As imagens são, no meu entender, representações de representações, sem nenhuma informação sobre o personagem. Estou me referindo ao filme a não as falas que antecederam ou foram posterior a projeção do filme.
    Lampião continua sendo esse personagem glamouroso.
    Abraço
    Reinaldo

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