Indicação do filme e apresentação: Maria Helena Correa
Textos: Maria Helena Correa e Joaquim Ferreira
Textos: Maria Helena Correa e Joaquim Ferreira
JUVENTUDE E ARTE
Assim é que a
paisagem deslumbrante e o SPA em Davos,
nos Alpes Suiços, nos fazem lembrar o romance de 1924 de Thomas Mann – A Montanha Mágica. Ali, num sanatório para
tuberculosos, as pessoas representavam um microcosmo da sociedade burguesa da
época, a maioria de doentes incuráveis. Era uma “viagem à decadência”, segundo palavras do proprio Mann. Eles conversavam sobre a vida, a politica do
entre-guerras, filosofavam e amavam. O SPA deste filme não é o mesmo - hoje
sede do Forum Mundial - mas a temática
permanece.
A decadência moral e física
contra a qual a alta burguesia luta, na rotina de tratamentos e banhos mostrada
em JUVENTUDE,também poderia ser vista como uma referência a filmes anteriores
do próprio Sorrentino: (1) Em AQUI É MEU LUGAR, de 2011, Sean Penn vive um
roqueiro britânico que ganhou muito dinheiro e vaga pela vida com ar entediado.
Ele reencontra seu gosto pela vida após sofrer uma experiência marcante nos EUA;
(2) Em A GRANDE BELEZA, filme com o qual foi premiado e saudado como o novo
Fellini, o protagonista é um repórter como o Mastroiani de A DOLCE VIDA, bem
mais velho e entediado com as festas da alta burguesia. Observamos que a música
agora é aquela batida de rave, com
luzes e pessoas de ar ausente. Ou seja, a
burguesia filmada por
Fellini também piorou
com o passar do tempo. Aqui não tem esperança, a grande beleza é mesmo a
paisagem de Roma.
Mas para o
protagonista de JUVENTUDE, um maestro entediado (Michael Caine, que foi o
belíssimo Alfie em 1966 e tem hoje 83 anos),aposentado “por motivos pessoais”
só mais tarde revelados, existe a possibilidade de reencontro da motivação para
a vida, através da criatividade que a música oferece. Ele irá retornar ao
convívio das platéias, assim como o roqueiro do
filme de 2011. Para isso pode ter contribuído o contato com alguns
jovens (a filha abandonada pelo marido, personagem de Rachel Weitz, e o ator
californiano em preparação para seu novo papel - o excelente Paul Dana, que já
nos deu o irmão em voto de mudez da Pequena
Miss Sunshine). Alguns dos diálogos entre o maestro e o ator são memoráveis,
destacando-se a irritação de ambos por serem unicamente lembrados por um
trabalho que consideram menor. Quem não conhece um artista com a mesma queixa?
Seu amigo de toda a
vida, o roteirista/diretor que se recolheu ao SPA para concluir seu
“filme-testamento” mas atravessa um
bloqueio criativo é Harvey Keitel -ator que vai também chegando aos 80 anos com
longa carreira de sucesso, geralmente em papéis de apoio, como Cães de Aluguel,
de Tarantino, mas também protagonista em O Piano, de Jane Campion.Os diálogos
travados entre os dois são recheados com
a preocupação sobre a
quantidade de líquido eliminada a cada
manhã, talvez a única menção à
decadência física masculina, até o momento em que terão oportunidade de
contemplar a Miss Universo nua na piscina.
A referência a Fellini perpassa todo o filme: tanto o
personagem do roteirista/diretor que não consegue achar o final adequado para
seu filme nos remete ao OITO E MEIO, como os delíros em que ele vê todas as belas
mulheres que já dirigiu em sua longa e bem sucedida carreira. Seriam inspiradas
em SATYRICON as imagens esfumaçadas dos idosos nos banhos do Spa? Nestes momentos, e no flash de uma cantora
romântica francesa que,logo após deixar o palco, se transmuta e ataca vorazmente
uma coxa de galinha, o diretor mostra de
forma cruel a feiura que Fellini soube elevar ao nível de Arte, com seus seres
bizarros.
A grande estrela do
filme-testamento é Brenda Morel, cuja maquilagem já não esconde a decadência de
sua beleza plastificada. Ela aparece no SPA para recusar o papel e dizer
verdades demolidoras sobre o que pensa da tentativa do diretor de continuar na
profissão apesar do visível declínio em sua longa e bem sucedida carreira. O
papel recebe a perfeita interpretação de Jane Fonda, símbolo sexual lançado por
Roger Vadim (Barbarella, 1968), também se aproximando dos 80 anos.Uma piada que
o diretor faz aqui é na fala em que a estrela no ocaso tenta driblar a
decadência, que ela reconhece, passando a fazer seriados para a TV, que paga
muito bem. Ocorre que a própria Jane Fonda está em cartaz – bela e elegante -
no Netflix, numa comédia deliciosa sobre casais separados após 40 anos de
casamento.
Num filme onde os
jovens não são os principais protagonistas, podemos perguntar: Afinal, por que
o título? A eterna busca do tempo
passado que hoje nos parece melhor, visto pela lente da nostalgia? A mensagem
de que a criação artística supera os
marcos cronológicos e nos torna eternos, enquanto presentes no mundo? Fico com o exemplo da vida real dos três
artistas “idosos” que carregam o filme
nas costas e com a visão que o jovem cineasta oferece no “show de bola” do
grande Maradona, gordo e considerado decadente, mas ainda capaz de dominar uma
bolinha de tênis no pé esquerdo e lançá-la repetidas vezes contra o azul do
céu.(Maria Helena)
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O filme não tem uma narrativa linear e parece que a
qualquer momento vai enredar por lições de vida cheias de pieguices e
lugares comuns. No entanto , a excelente direção de fotografia costura , direciona e redimensiona essa narrativa com o que há de mais
seminal e genuíno na linguagem do cinema: o movimentoda imagem e seu tratamento. Planos e enquadramentos corretos, " longos" e " close-ups", economizam palavras . O passeio da câmera pelas
paisagens dos Alpes suíços e, sobretudo ,pelos exteriores e formas dos
seres humanos jovens e velhos que freqüentam o hotel/spa, revelam
aparências , passando para nós,a necessidade de construirmos diálogos
interiores para entramos e sairmos do filme com a impressão de que o
cinema ainda vale muito como instrumento de análise da vida.
A vida
em "Juventude" fala de emoções,de desejos, do envelhecimento e da
juventude, não necessariamente na ordem determinista que conhecemos.
Idade é atitude para jovens ou idosos. Não se critica a juventude e sim
o fugaz e o instantâneo, que afinal podem estar em qualquer faixa
etária. Cultura , memória e experiência subvertendo o determinismo
biológico
Numa cena ,o diretor de cinema Mick oferece aos jovens
cineastas que produzem seu filme , uma visão das montanhas pela
perspectiva ampliada de uma luneta. Com o visual da montanha ampliada ,
Mick , metaforicamente ,diz:
" - Está vendo aquela montanha? É assim que se vê quando se é jovem. Tudo parece estar bem próximo. Isso é o futuro.
Ao
inverter a luneta, se espera a montanha distanciada : " - Isso é o que
se vê quando se é velho. Tudo parece bem distante . É o passado.",
afirma Harvey Keitel. Porém, a imagem é focada no grupo de jovens roteiristas
tendo a montanha como fundo : genial!
Outro destaque é a
participação simbólica de um ex-jogador de futebol ,inspirado
abertamente em Diego Maradona que trata da sáude no hotel/spa ( o diretor
Sorrentino é fã do ex-craque argentino do Napoli dos anos 1990 ). Diego
na cadeira do spa, gordo e cansado, sonha com seus áureos tempos de
jogador e responde sobre o que pensa ao ver seu passado: "- Penso no
futuro." E isso tudo, depois do Maradona do filme fazer varias
embaixadinhas com uma bola de tênis. Constatação de quem só joga
"bolinha" ou a afirmação de quem por já ter jogado um bolão na
juventude pode, no envelhecimento , fazer menos, porém com mais
qualidade?
(Joaquim Ferreira)
Irei assistir mais de uma vez. Merece. É do “tipo assim” maneiro , sacou ?
ResponderExcluirNão dá para ir ao banheiro, beber água ou cochilar. Só parando a exibição. É o que farei da próxima que revê-lo.
Os diálogos são reflexões, embates permeados de ironia, humor, fracassos profissionais e existências, ressentimentos, culpas ... ou seja tudo que o ser humano acumular em sua trajetória de vida.
Vamos imaginar um local onde existem budistas. Mas atenção! Não estou falando de um templo budista austero, com sininhos rompendo o silêncio sepulcral para dar início a uma modesta refeição à base de ervas e grãos naturais. Estamos num local onde “templo, SPA, mosteiro, terapia de grupo e sensualidade, misturam-se com fotografias deslumbrantes.
Neste local os personagens fazem suas reminiscência. Nada de baixo austral. A amizade oriente a fala, a decrepitude e beleza do corpo são expostas sem contornos, efeitos especiais, ou maquiagens. É o corpo no tempo, local transitório. Então cada personagem formula sua subjetividade emerge, decisiva, sem escrúpulo, aqueles segredos recalcados.
O filme é uma homenagem a simplicidade, aceitação irrestrita quando a vontade de um encontro fatal não pode ser evitado. A amizade é campo de discordância ocasionais.
Por que não continuar a escrever sobre Juventude ?
Porque o filme descreve relatos humanos com todas as potências, que somente os humanos nas suas convivências pode acumular.
É uma canção SIMPLES em homenagem a Amizade.
Muito bom post, obrigado, o filme é maravilhoso como tudos os filmes de Michael Caine, recentemente o vi em um filme diferente de comédia. Quando vi o elenco de Despedida em grande estilo, automaticamente escrevi nos filmes que deveria ver porque o elenco é realmente de grande qualidade, ancho que é umo dos mais divertidos, eu adoro Michael Caine filmes, éste é um dos meus preferidos, por que sempre leva o seu personagem ao nível mais alto da interpretação, seu trabalho é dos melhores. Eu ri muito
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