sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Viridiana ( Luis Buñuel;1961)

 


Na seqüência de nossas sessões presenciais na  Euterpe Lumiarense,  exibimos na  ultima terça -feira, 23/11, o filme " Viridiana", de Luis Buñuel.O filme foi indicado  e apresentado por Virgilio Roma.
Produção espanhola de 1961, o filme ganhou  Palma de Ouro do Festival de Cannes de 1961 e é considerado por diversos críticos como  um dos melhores da história do cinema 
A obra cinematográfica de Buñuel é marcada  por características  que o colocam na posição de um dos mais controversos cineastas do mundo. Na sua vasta obra, composta de 33 filmes em cinqüenta anos de carreira, obras como "Um Cão Andaluz" (1928) , "A Idade do Ouro" (1930); "Terra sem pão" (1933);  "Os Esquecidos" (1950); "O Anjo Exterminador" (1962), "A Via Láctea" (1969) ; "La Belle de Jour" (1967), "Tristana" (1970).; "O Discreto Charme da Burguesia " (1972), "Esse Obscuro Objeto do Desejo" (1977), dentre outras, mostra Buñuel explorando   temas com o  amor louco, o anticlericalismo, o inconformismo diante do convencional, a  transcendência mostrada  em imagens  alucinatórias , utilizando  um  humor caustico e , muitas vezes, uma certa singeleza nas imagens  que marcaram seu estilo 
Segundo Buñuel , 
" A moral burguesa é a i-moral,contra a qual devo lutar.A moral fundada sobre nossas tão injustas instituições sociais, como  a religião, a pátria, a família, a cultura;enfim, aquilo que se chama os pilares da sociedade"(Entrevista de 1960)
É uma filmografia densa, sinuosa  .mas  muito  fiel a vida que Buñuel levou, desde a convivência  com os surrealistas nos  anos 1920  , os problemas de gênero com Garcia Lorca  até o rompimento com Salvador Dali nos anos 1940, passando por seus diversos destinos e"exílios" . Ao  deixar a Espanha com o início da Guerra Civil  em 1938., foi para A França, Estados Unidos e México . Regressa a Espanha no início da década de 1960  e realiza Viridiana
Em Viridiana , o estilo de Buñuel  a meu ver, tem  um conteúdo mais político, mesmo que não explicito . É  uma critica profunda  a ditadura de Franco  que, teria   aceitada  ingenuamente subsidiar e promover o filme no Festival de Cannes de 1961, sem que governo examinasse previamente a obra.  Se Franco foi ingênuo a esse ponto não posso afirmar   mas que a genialidade  superou  a ditadura, isso é fato! Depois o filme foi proibido na Espanha e só foi reexibido  no pais com o fim do franquismo.
Os elementos que sustentavam a ditadura de Franco são alegoricamente tratados no filme:  especialmente os  conceitos habituais de caridade e virtude cristãs. da Igreja Católica , uma das bases de apoio ao franquismo. .Viridiana representa   a submissão do baixo clero a tal  da caridade , limitada por natureza  em termos de capacidade para superar a pobreza e  conceder aos pobres autonomia para transformação social . 
A aristocracia, outro sustentáculo do franquismo,  e  representada no filme por Don Jaime (Fernando Rey), que quer a todo custo seduzir a noviça Viridiana(representada por  Silvia Pinal.,) .Don Jaime morre sem conseguir seu objetivo e é substituído pelo  filho Jorge (Francisco Rabal,) na condução dos negócios  .Este apresenta  uma postura moral  mais "moderna" porem também hipócrita e sem ser transformadora ,  típica de frações da classe dominante  que se  alternam  no controle do poder.  .A cena final envolvendo Jorge  mostra bem a moral que Buñuel tanto criticava.
Viridiana , que etimologicamente significa   “a verdadeira divina"  , também leva o nome de uma santa católica  italiana do século XIII,  condenada por blasfêmia e indecência  pela autoridade papal.
A cena mais marcante de "Viridiana" na minha opinião, é a profanação ,marca de  Buñuel, ocorrida durante a ceia dos mendigos que redimensiona   os   atos caridosos e de  fé de Viridiana 
A cena quebra a "harmonia"  do filme quando os mendigos são deixados sozinhos na casa de Dom Jaime. Sem os “patrões”, os pobres realizam  um banquete , onde reproduzem " A Última Ceia"  de Leonardo Da Vinci. E na fotografia que congela e  transpõe   o quadro de Da Vinci para o filme de Buñuel, a posição no centro do quadro que é originalmente a de   Jesus Cristo  é representada   pelo líder dos mendigos, que é um cego! Na  seqüência o mundano se impõe sobre o sagrado,  mandamentos e sacramentos  são transformados  e pecados cometidos :   um dos mendigos, vestido de noiva, dança a  Aleluia de Handel , há estupro, destruição de objetos da casa e tentativas de assassinato. Uma inferência que fiz ao rever "Viridiana" tem origem na  demonstração que a caridade não concede autonomia..O baixo clero -Viridiana- sufocado pelo controle hierárquico da Igreja Católica submete-se a essa constatação Ao optar pela vida mundana expressa na cena final, a ex-noviça transforma--se abandona a caridade , transforma-se  moralmente e  não se interessa pela organização política  dos pobres.É  anarquia social verificada no banquete citado e,  possivelmente para Buñuel ,a representação  da própria desorganização da oposição   sindical, partidária e política da Espanha franquista..
 Assim,  
" A traição de Viridiana em relação ao seu Deus-Igreja compõe uma das sequências finais da obra, quando ela queima os objetos religiosos e penteia-se e maquila-se para uma visita ao homem que ela secretamente desejava. A ex-noviça começa (ou termina) a sua jornada ouvindo jazz e jogando cartas com Jorge e a empregada da casa, com quem ele mantinha um caso. A câmera abandona o “trio pecador” afastando-se lenta e dramaticamente, pondo-se à distância, como que envergonhada. O desejo alcança a sua vitória ao fim da fita e, na mesa de jazz, cartas e sexo, cada ponta do triângulo tem uma vontade oculta a realizar. mundo. " (Luiz Santiago . Disponível em https://www.planocritico.com/critica-viridiana/)

Típico filme para ser visto ,revisto e a cada exibição ter a percepção de ser uma obra nunca vista! 



Viridiana– Espanha, México, 1961
Direção: Luis Buñuel
Roteiro: Luis Buñuel, Julio Alejandro (adaptação da obra de Benito Pérez Galdós)
Elenco: Silvia Pinal, Fernando Rey, Francisco Rabal, José Calvo, Margarita Lozano, José Manuel Martín, Victoria Zinny, Luis Heredia, Joaquín Roa, Lola Gaos, María Isbert, Teresa Rabal
Duração: 90 minutos

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