quinta-feira, 20 de junho de 2019

Pequena Miss Sunshine( Valerie Faris, Jonathan Dayton;2006)



Indicação e apresentação do filme: Débora Zarour
Texto: Reinaldo Silva

Decorrido muitos anos tive a grata surpresa de ver novamente esse filme. Não sei dizer a data e nem em que condições. Mas foi como se fosse pela primeira vez. É desta forma que vou fazer meu comentário.
O filme é uma narrativa irônica e bem humorada sobre o valor moral fundamental da sociedade americana. Não pretendo tratar da sua origem, ou seja, aprofundar e tentar responder as questões morais retratadas e ironizadas pelo filme. É apenas uma exposição.
O Estados Unidos, como nação (e como toda nação) possuem um mito de origem. Existe a crença de que foram eleitos por Deus para representar os seus interesses nos desígnios da Terra, ou seja, grosso modo, como os seres humanos devem agir. Para os americanos os Estados Unidos agem sempre em nome de Deus. E, nesta nação dos escolhidos, é necessário que haja uma depuração, uma seleção, uma concorrência, um esforço individual para separar os “vencedores dos perdedores”. Tudo que acabei de escrever deve corresponde a trabalho, competição e ambição em busca de riqueza material. Espírito e corpo unidos por uma única vontade: sucesso material = felicidade. Quanto mais cedo se ganha um milhão de dólar, mais cedo o ingresso ao mundo dos “vencedores” é oferecido. Em resumo, a mentalidade americana é regida pelo individualismo possessivo.
É justamente sobre a mentalidade “vencedores e perdedores” que o filme retrata. A narrativa é toda feita neste sentido, e sendo irônica irá fazer uma escolha contraria ao “capitalismo messiânico” dos “vencedores”.
E qual é a base da pirâmide social que a narrativa do filme ironiza? Quem respondeu a família acertou. Veja se você consegue unir as pontas da pergunta a seguir sem tomar um chá de camomila: imagine (1) uma família composta por um avô desbocado, machista até o osso e viciado em cocaina; (2) um pai palestrante motivacional com 4 ou cinco espectadores em suas palestras e também escritor frustrado e insuportável para todos os demais familiares; (3) uma mãe a beira de um ataque de nervos sem saber o que fazer com o filho que faz votos de silêncio a meses e só se comunica escrevendo bilhetes, nos quais declara que odeia todos e tem o retrato de Nietzsche na parede do quarto; (4) a mãe tem um irmão gay, que acaba de ter alta do hospital por ter tentado suicídio devido a uma recusa amorosa; e finalmente, (5) a filha caçula obstinada em participar do concurso de “miss sunshine” assiste obsessivamente aos vídeos dos campeonatos e é “treinada” por seu avô, aquele mesmo que citei acima.
Se esse quebra cabeça não conseguiu ser montado não há com que se preocupar, porque a “insanidade” é o elemento fundamental da narrativa do filme. Ele informa que os “perdedores” tem seu dia de glória, e os “vencedores” são o resumo de uma padronização turbinada por maquiagem que transformam os rostos em máscaras plastificadas, sorrisos congelados , pura ficção de um povo eleito.
Essa é a inversão que o filme faz. Na América dos eleitos os “perdedores” zombam e ironizam
os “vencedores”, com suas palestras compostas de 9 passos para a conquista do $ucesso. Para quem ainda acredita nesta separação entre “vencedores e perdedores” há um obstáculo a ser transposto, que diz respeito a frustração de não mais poderem vislumbrar o retorno de uma América eleita por Deus e reservada para os “vencedores”.
Uma pequena observação que a minha exigência obriga. Pela qualidade técnica, montagem, direção e atuação dos atores e atrizes, o filme merecia um melhor tratamento fotográfico. Não vou entrar em detalhes, porque os comentários a esse respeito são válidos somente quando feitos no decorrer das cenas, exemplificando-os na medida em que focalizadas pela lentes das câmeras.


Nenhum comentário:

Postar um comentário