Apresentação do filme : Miguel Armando Perez
Texto: Reinaldo Silva
Comandante ou um mito moderno
chamado Fidel
Este comentário não aborda Fidel Castro num confronto
ideológico entre o certo e o errado nem sobre os aspectos da revolução cubana e
seu desdobramento. Não tem a carga moral do bem e do mal.
Vivemos num mundo em que a busca do convencimento é uma arma
permanente de persuasão, manipulação e sedução. É um mundo com pântanos que o
senso comum, os discursos das mídias impressas (jornais, livros e revistas),
eletrônica (televisão), e no presente as mídias sociais, criam para nos fazer
acreditar em “verdades”, “realidades”, “neutralidades” e “objetividades” dos
fatos.
Todos esses espaços servem à luta política, principalmente
quando retratam indivíduos de uma forma personalista. O que desejam é gerenciar
a nossa atenção. Proliferam as ilusões de crenças e obscurecem o
esclarecimento. Acreditam que somos todos tolos, consumidores de novidades. Portanto,
minha intenção não servirá a esses propósitos.
Não só Fidel, mas Che Guevara e a revolução são os três
pilares de sustentação da estrutura do mito. É impossível mencionar apenas um
elemento dessa estrutura sem tocar nas outras duas. Che é o mito da revolução
permanente, de um bem estendido as sociedades da América Latina.
São os três pilares acima mencionados que o filme de Oliver
Stone esmiúça, com suas lentes focadas em diversos ângulos, que faz a câmara
tremer em diversas ocasiões, diálogos provocativos, entrecortados pelas mãos,
rosto e corpo inteiro de Fidel. Oliver Stone expõe o mito em seu estágio de
idade avançada.
Fidel é um líder carismático das massas porque a sedução é
uma fusão afetiva puramente emocional, o êxtase e o encanto que sua enérgica
postura de pai provedor provoca, acompanhada de um discurso de atos de bravura,
canaliza e promovendo uma vontade de superação coletiva das dificuldades
materiais.
Um inimigo comum, espécie de grande mal, fortalece a união
da massa em torno do líder Fidel. O grau de religiosidade faz parte da dimensão
altruísta emanado pela sua figura. Ele inclusive relata o sacrifício dedicado à
revolução. Nas cenas externas, principalmente com estudantes, ocorre um
frenesi, a tensão dos braços erguidos para tocá-lo, como somente os santos
irradiam. Um beijo de Fidel é motivo de lágrimas.
Seu surgimento e de Che Guevara como mitos modernos está
localizado num período histórico em que as utopias marxistas vigoravam como
lema central na luta política contra a miséria econômica e conseqüente opressão
de classe nas sociedades capitalistas.
Não há como entender o mito Fidel revolucionário se não localizar
a sua figura num ambiente mundial da “guerra fria”, dividido pelo capitalismo
americano e o socialismo soviético. E ainda, pela resistência a partir do
início do bloqueio econômico imposto pelos americanos na década de 60. A
própria resistência ao bloqueio foi a chama que manteve acesa a figura de Fidel
como mito.
Outro elemento importante para manutenção da chama do mito
Fidel teve a participação de depoimentos artistas de diversas áreas, filmes,
publicações de livros, festivais, além das “realizações” de Cuba, principalmente nas
áreas de saúde e educação.
Mas o que restará no futuro do mito Fidel?
O avanço do capitalismo na sua forma globalizada não suporta
os bens duráveis, tanto materiais quanto como idéias. O capitalismo se propõe a
si mesmo como um modelo indestrutível. E nisso que os seus defensores
acreditam. Até que ele próprio se destrua, aniquilando todos os meios de
extração da natureza.
Não acredito que os mitos modernos e arcaicos estejam ausentes
da efemeridade em nosso dia a dia.
Como todo mito, Fidel (como aconteceu com Che Guevara) se
transformará em objeto de consumo de camisetas, pôster, flâmulas, tatuagens
etc. O duplo avanço das tecnologias, e de um acelerado consumo material, causam
efeitos na instabilidade emocional e nas escolhas de longa durabilidade dos
indivíduos.
Acredito que um dos temas mais fascinantes atualmente é o
que a aceleração produz em nosso cotidiano. A rapidez que nos provoca a
fornecer respostas quase que instantaneamente.
Para terminar uma imagem:
Caminha-se sobre uma fina camada de gelo. A ordem é não
parar, porque senão afunda.
O mito é a embriaguez de um tempo sem retorno as suas
origens.
Reinaldo Silva
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