segunda-feira, 15 de agosto de 2016

O Violino Vermelho (François Girard;1998)




Indicação do filme e apresentação: Vera Young
Texto: Reinaldo Silva


Reinaldo entrevista François Girard,  diretor do filme O Violino Vermelho  e o ator Samuel L.Jackson, que interpretou um especialista de arte no filme

Reinaldo:
Podemos afirmar que o roteiro do filme mistura os gêneros drama, histórico, policial ou suspense, e que a fotografia e o ritmo das cenas acompanham as mudanças na medida em que o violino percorre desde a idade média até o período moderno?
Diretor:
Sem dúvida tivemos essa preocupação. Um filme só é possível porque existe uma equipe técnica que cuida das diversas etapas da produção. O cinema foi imaginado como templo para exposição da nova arte visual, quando a arte era pensada num sistema de valores de cunho religioso. A industrialização moderna não é a ruptura da áurea religiosa em todos os campos da sociedade. Nosso imaginário não é moderno ou pós-moderno. Acompanha o tempo com suas mudanças culturais.
Por intermédio de técnicas industriais, o filme modificou o nosso imaginário, interferiu em nossas emoções, influiu em decisões políticas individuais, coletivas e na gestão política do Estado.
Desde o advento da televisão o cinema como “áurea religiosa” deixou de existir. A arte transformou-se num mercado, seguindo as condições da globalização dos negócios.
Reinaldo:
Então, o violino vermelho seguiu a mesma tendência dos negócios globalizados, certo?
Diretor:
O violino não tem valor nenhum sentimental para o capital. Ele passou por todos os regimes ou sistemas políticos desde do seu nascimento. Monarquia, República, Comunismo e Capitalismo. O violino vermelho é o valor sentimental enquanto havia a uma Monarquia, que exprimia seus valores no período romântico da história ocidental. Esse é o seu valor: objeto do período romântico.
Já o capital está se lixando para isso,seu interesse é o lucro. A técnica ou as tecnologias só tem valor se atendem as demandas do capital. Bolsa de valores da arte.
Reinaldo:
Quero fazer uma pergunta ao Samuel. No filme você tem um papel decisivo. Seu personagem é um especialista respeitado, e age como se fosse um detetive, até descobrir que o vermelho do violino era sangue e não tinta conforme as primeiras impressões.
Você concorda que um especialista é também um detetive?
Samuel:
Os detetives e os especialistas, em suas respectivas áreas, utilizam técnicas, conhecimentos analíticos, para distinguir o verdadeiro do falso ou vice versa. No caso dos especialistas, o que está em jogo é a autenticidade dos objetos. Para os detetives, o que está em jogo é o resultado das investigações para se chegar ao(s) verdadeiro(s) autor(es) do crime.
Não tinha a menor desconfiança de que o vermelho do violino era sangue. O técnico que trabalhava para mim ficou encantado com um som que ouviu ao fazer um teste de acústica no violino. Quem assistiu ao filme sabe que era o som de um gemido feminino emitido momentos antes do parto. Minha intenção era apurar a idade cronológica e autenticidade do verniz do violino. Por isso solicitei o exame de DNA.
Reinaldo:
A ficha só caiu quando você recebeu o resultado do DNA. Eu só descobri quando o leiloeiro comenta as suas despesas, minutos antes de você decidir trocar o violino vermelho por um violino cópia, tendo como cúmplice o assistente técnico, momento que antecede os lances dos interessados na compra do violino. A cena vai e volta durante todo o filme o que provoca o suspense.
Samuel:
Para proteger o autêntico violino vermelho, o professor chinês utilizou a técnica de reprodução de cópias do violino, utilizando talvez uma tinta vermelha. Não fica claro se ele também se apaixonou pelo violino vermelho. O certo é que a militante chinesa coloca a sua vida em jogo para salvar o violino.
Por onde o violino passa, por séculos, desperta todo o tipo de paixão, que são inconcebíveis para a revolução chinesa, e acredito para qualquer revolução, a não ser a paixão pelo poder.
Reinaldo:
O violino simboliza o renascimento da esposa de um artesão que utiliza o sangue dela, após a morte advinda do parto do seu filho, que manterá uma fusão com o corpo-violino da mãe até a sua morrer durante uma apresentação a um conde prepotente e com esnobismo efeminado. Então imagino que o violino é a concretização do poder da imortalidade da alma da esposa, concebida por um mestre artesão, certo?
Afinal de onde vem esse poder do mestre artesão?
.Diretor:
De Deus. O mestre artesão é o portador do poder divino.
Reinaldo:
Será que o filme não faz uma alusão a pesquisa científica do Projeto Genoma, na medida em que somos informados, grosso modo, que a partir do desvendamento de nossa “verdadeira” natureza, a biologia ditará as condições da vida humana sobre a terra, que identificará as causas de todas as doenças, que fará com que o ser humano viva por um longo período, quem sabe, 100 ou 200 anos?
Será que o violino vermelho não é também uma metáfora desse projeto na medida em que ele representa um corpo que viveu durante séculos?
Diretor:
Talvez. Se algum dia isso acontecer e eu ainda estiver vivo, então voltarei acreditar na idealização de uma espécie de “paraíso da vida eterna”, que nos foi retirada com o pecado original de Adão ao comer o fruto proibido.
As pesquisas no campo da biologia estão empenhadas neste tipo de mentalidade. No futuro seremos obrigados a viver numa espécie de bolha crionizada como se encontra atualmente o Walt Disney. Será o apogeu supremo de uma classe de indivíduos vivendo “eternamente”. Idéia insuportável, não acha?
Reinaldo:
Certamente. Uma última pergunta. Os diretores sabem ou imaginam as possíveis interpretações que seus filmes poderão alcançar?
Diretor:
O filme mobiliza o imaginário. Não existem imaginários idênticos ou semelhantes. Os críticos de filmes tentam repercutir suas interpretações porque é sua profissão. Atualmente existem diversos livros, sites, blogs etc na Internet sobre cinema.
Soube que o Violino Vermelho teve uma projeção no Cine Estalagem que fica em Lumiar. Parece que foi indicado por uma pessoa chamada Vera Young, que fez uma pesquisa exaustiva e elogiou bastante o filme. Valeu!!
Também fiquei sabendo que em Lumiar existem muitos beija-flores. Sou um grande admirador dessa espécie. Gostaria de fazer um filme singelo, contando uma estória de amor entre dois beija-flores.. Você conhece alguém em Lumiar que pode me assessorar para isso?
Reinaldo:
Obrigado a você e ao Samuel  L. Jackson.

Reinaldo Silva


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